
Para quem gosta de literatura portuguesa, Lisboa é incomparável. Afora nos sentirmos personagens de um romance de Eça de Queiroz, há dois locais de enorme valor afetivo e literário na cidade: a Fundação José Saramago e a Casa Fernando Pessoa.
A Casa é o local onde viveu Fernando Pessoa nos seus últimos 15 anos de vida, a partir de 1920. O edifício está localizado no bairro Campo de Ourique, um prédio típico de Lisboa, espremido entre outras duas construções.
No térreo há uma loja com diversos livros e souvenirs com versos ou a imagem do poeta, a bilheteria e, no que seria o pátio do prédio, um simpático café. Adquirido o ingresso, a orientação é começar a visita pelo terceiro andar. Lá encontramos a primeira parte do museu com uma exposição permanente chamada de “Heterônimos”. Logo na entrada ouvimos uma máquina de escrever, e no chão vão sendo projetados diversos nomes que são personagens ou heterônimos criados por Fernando Pessoa. Adiante nos deparamos com um jogo de espelhos incrível, daqueles que criam reflexos infinitos nossos, acompanhados da pergunta: “quantos sou?”. Essa instalação já mostra como a curadoria é impressionante ao dialogar de fato com a obra do poeta sem abrir mão da linguagem visual própria de um museu.
Descendo para o segundo andar, encontramos a biblioteca particular que pertenceu ao escritor. Os livros que comprou, recebeu de amigos, ganhou, herdou, editou, leu e profusamente anotou constituem um espólio valioso que está na origem da fundação da casa, uma biblioteca com cerca de 1.300 títulos, mais da metade em língua inglesa. Sobre um balcão, diversas edições das obras do poeta nos mais variados idiomas criam um mosaico belíssimo e mostram a força da sua obra para além das fronteiras de Portugal e da língua portuguesa.
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Mas a maior emoção está reservada para o primeiro andar. Ao entrar, nos deparamos com uma cama e um baú, e aos poucos vamos entendendo que estamos no exato lugar em que o poeta viveu seus últimos 15 anos de vida – há inclusive um desenho da planta no chão mostrando que a cama era naquela posição do quarto. Além dos móveis, encontramos alguns objetos de Fernando Pessoa, como seus clássicos óculos, cartas que ele trocou, joias e fotos da família na parede. Um display interativo traz testemunhos sobre a vida do poeta, inclusive com depoimento de uma sobrinha que morou naquele apartamento com ele.
Em um ambiente ao lado somos surpreendidos com uma instalação impactante de folhas pelas paredes e pelo teto partindo de uma cômoda. O som ambiente é de caneta riscando um papel. Próximo dali, uma folha manuscrita com a frase “I know not what tomorrow will bring”. Esta foi a última frase escrita pelo poeta no hospital, em inglês mesmo, e a folha na qual ele escreveu está ali, diante de nós. O último verso do agora imortal Fernando Pessoa, mas que em vida não foi reconhecido, tendo publicado apenas um livro, “Mensagem”, em 1934. Sua casa simples é um reflexo disso. Pessoa era um escritor como nós, e talvez por isso emocione tanto entrar em seu quarto, ver seus livros, objetos, caligrafia.
Fernando Pessoa
Fernando Pessoa é um dos maiores nomes da literatura portuguesa e uma das figuras mais importantes do modernismo na literatura mundial. Nascido em Lisboa em 1888, passou parte da infância na África do Sul, onde aprendeu inglês e começou a escrever na língua que o acompanharia por toda a vida. De volta a Portugal, viveu discretamente, trabalhando como tradutor e correspondente comercial, mas dedicando-se, em silêncio, a uma das obras mais complexas e fascinantes da literatura mundial. Pessoa criou os hoje famosos heterônimos Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos, Bernardo Soares, entre tantos outros, cada um com biografia, estilo e visão de mundo próprios. Tais heterônimos, vale dizer, são recuperados no Museu da Casa Fernando Pessoa, e amantes do poeta poderiam passar horas decifrando cada personalidade.
Apesar de ser hoje um ícone da cultura portuguesa, em vida foi pouco reconhecido. Publicou apenas um livro em português, “Mensagem”, em 1934, um ano antes de sua morte. Sua genialidade só seria plenamente revelada após a descoberta, dentro de um baú, de milhares de manuscritos, poemas, cartas e fragmentos.
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