
Cultura não é luxo, nunca foi. A cultura é mais do que expressão artística, ela é ferramenta de desenvolvimento humano, inovação, inclusão e bem-estar. Quando fomentada de forma estratégica e acessível, gera cidades mais equilibradas, plurais e prósperas.
A cultura acontece de forma eficiente, onde o valor simbólico e o impacto econômico caminham juntos.
É aflitivo pensar sobre os possíveis conflitos sociais e econômicos que podem ser gerados pela ausência de investimentos na melhoria do potencial cultural das cidades e suas populações, levando em conta a importância e a relevância econômica da cultura no quotidiano dos municípios.
Pensar que o investimento em cultura é algo “secundário” é um erro que cobra seu preço de forma silenciosa, porém constante no dia a dia das pessoas.
Quando não há investimento em cultura, o chamado “tecido social” se fragiliza. Isso é inevitável! A rua vira apenas passagem e não um lugar de convivência. As praças viram atalho e não sobra espaço para os palcos. A juventude perde referências de pertencimento e inventividade. Os talentos se dispersam ou se apagam!
A consequência, é que as desigualdades aumentam, claro! Não porque as pessoas deixaram de ter valor, mas porque o valor das pessoas, deixou de ser reconhecido, promovido e celebrado.
O risco de se neglicenciar a cultura
A ausência de políticas consistentes para desenvolver o potencial cultural de um município compara-se a um terreno fértil, que não foi irrigado, tudo ali poderia florescer, mas vai secando aos poucos. Sim, com isso, surgem tensões sociais, exclusões econômicas e uma perigosa desconexão entre as pessoas e os espaços que habitam.
Da mesma forma, a ausência de investimentos na cultura em ambientes urbanos, não gera apenas um esvaziamento da arte, mas compromete a coesão social, seguramente fragiliza economias locais e dificulta o florescimento de identidades coletivas, tão importantes para o desenvolvimento intelectual e social dos lugares.
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Quando o potencial cultural das cidades e de suas populações é negligenciado, caminhos se abrem para conflitos ramificados e silenciosos. A marginalização, a desigualdade de acesso à produção e fruição cultural, além do enfraquecimento natural da cidadania, que precisa ser ativa.
Cultura influencia também a economia
Do ponto de vista econômico, o impacto é direto, já que sem cultura, a cidade perde oportunidades de gerar renda criativa, deixa de atrair turismo responsável, não estimula pequenos negócios e retem profissionais, que poderiam estar movimentando cadeias produtivas locais ligadas a eventos, gastronomia, design, tecnologia, moda e tantas outras expressões culturais.
Parece pouca coisa, mas é uma perda de PIB que nem sempre aparece nos relatórios, mas está no vazio das ruas sem movimento e dos centros culturais fechados, hora por falta de verba, hora pela falta do público.
A cultura deve ser entendida, como uma potência social e econômica. É muito arriscado, pagar pra ver quais os impactos econômicos e sociais da desvalorização cultural.
A cultura movimenta empregos, fomenta a atividade turística, dinamiza cadeias produtivas e criativas e promove a economia circular. Sem investimentos, essas engrenagens perdem força.
A escassez de apoio aos movimentos, aos coletivos culturais produtivos, aos artistas locais e sem espaços públicos culturais competentes, a geração de renda se vê comprometida e pra variar, começando pelas áreas periféricas, acentuando disparidades.
Claro que saúde, educação e saneamento de qualidade sempre serão prioridades, mas o apagamento da cultura como política estruturante bloqueia o diálogo entre diferentes grupos sociais e enfraquece os vínculos de reconhecimento e pertencimento.
Ainda que o financiamento público seja fundamental, a dependência exclusiva do setor, pode tornar iniciativas culturais vulneráveis à sazonalidade política, isso nunca prestou! Cortes orçamentários ou mudanças de gestão podem interromper projetos de grande impacto social e as comunidades precisam buscar alternativas para não serem reféns deste movimento.
A questão é clara, onde falta cultura, sobra intolerância e os conflitos se instalam. Onde não se investe em diálogo, crescem ruídos. Onde não se promove expressão, surge a frustração. E o resultado, muitas vezes, é a escalada do desânimo coletivo.
Para além das políticas públicas
É possível e precisamos reagir, mesmo em contextos em que, eventualmente o poder público negligência ou abandona a cultura, se bem que isto tem sido mais raro atualmente, graças a Deus.
Populações podem se organizar em redes de cooperação, criar movimentos independentes, coletivos culturais autônomos, pontos de leitura, ocupações criativas, editais comunitários e buscar soluções de financiamento colaborativo.
Um bom exemplo, é a economia solidária. É preciso compreender os fundos rotativos, incentivar o apoio mútuo entre coletivos ou movimentos culturais e quem sabe, inovar com editais híbridos, juntando o público e o privado e, apesar de cada vez mais difícil, buscar por parcerias com instituições e empresas locais.
Não é fácil, mas são caminhos reais para manter viva a produção cultural, mesmo em tempos escassos. É preciso fortalecer a ideia de que bem-estar e qualidade de vida não dependem exclusivamente do poder público.
A cidadania cultural se constrói também com protagonismo popular, inteligência coletiva e estratégias de resiliência social. Claro, o protagonismo social é difícil de ser alcançado, afinal, carece de organização, de lideranças dispostas e muita estratégia, mas o acesso à cultura pode e deve ser defendido como direito, mas também como ação concreta, gerada por quem vive e movimenta as cidades diariamente.
Acaba virando uma frase de efeito, mas de verdade, resistir culturalmente é também uma forma de projetar o amanhã, com mais qualidade de vida e com o bem-estar social instalado nos lugares. As cidades podem ser mais do que um lugar para morar, elas devem ser lugares para vivermos plenamente.
Atualmente o terceiro setor tem sido mais demandado, o que exige das entidades estabelecidas, mais organização e seriedade. Este é um ponto positivo, já que os modelos colaborativos e sustentáveis estão cada vez mais possíveis, por meio de parcerias entre OSCs, comunidades e empresas locais. Este comportamento modernizado, fortalece a autonomia e diversifica as fontes de apoio do setor.
Da mesma forma, faz-se importante, a busca de investimentos na qualificação para uma boa gestão cultural, fomentar o empreendedorismo, incitar a criatividade e se movimentar socialmente. Tudo isso amplia a sustentabilidade de projetos e gera boas ideias.
Ativo de bem estar
A cultura, ou o fazer cultural, como muitos preferem chamar, deve ser visto como um ativo de bem-estar, que valoriza a vida e as comunidades, que transcende expressões artísticas e se firma como força estruturante da vida comunitária. Fortalecer vínculos sociais não prejudica ninguém, promover inclusão e despertar o senso de pertencimento, é uma necessidade, especialmente para a juventude.
Se soubermos integrar valores, práticas e saberes que refletem a identidade local, vamos estimular a convivência saudável, valorizar a diversidade e potencializar o desenvolvimento humano.
Por isso, mesmo diante de desafios, é possível acreditar em um futuro mais justo e vibrante quando reconhecemos a cultura como aliada da transformação social. Quando uma comunidade escolhe valorizar sua cultura, ela escolhe se fortalecer, se proteger e se projetar para um futuro com dignidade.
Até a próxima.