
Maurício Antônio Lopes — Pesquisador da Embrapa Agroenergia e membro da Academia Brasileira de Ciência Agronômica (ABCA)
A COP30, realizada em Belém, traz o mundo ao coração da Amazônia. A carga simbólica do evento é evidente, pois, pela primeira vez, a conferência climática das Nações Unidas ocorrerá em um território que sintetiza os dilemas e as esperanças da humanidade diante da crise climática. Mais do que palco de negociações, a Amazônia é um espaço onde se colocam os desafios e as soluções para unir desenvolvimento e proteção da natureza.
A Academia Brasileira de Ciência Agronômica (ABCA) apresenta à COP30 uma proposta baseada na bioeconomia das conexões, entendida como uma abordagem que busca superar o isolamento entre setores e disciplinas, condição que ainda limita a transição sustentável. Jovem e atuante, a ABCA reúne lideranças da ciência agronômica comprometidas em fortalecer a base científica da agricultura tropical e afirmar seu papel como infraestrutura estratégica para a soberania alimentar, a sustentabilidade e o desenvolvimento do país.
A visão da ABCA para a COP30 reconhece que os desafios climáticos, energéticos, alimentares e sociais são interdependentes e exigem soluções guiadas pela lógica dos nexos — as inter-relações entre água, energia, alimentos, biodiversidade e sociedade. Por isso, a ABCA propõe um modelo de bioeconomia capaz de integrar esses elementos. Seu fundamento é sistêmico: o desenvolvimento sustentável depende das interações entre pessoas, ecossistemas, territórios e instituições, e não de ações isoladas.
Essa visão difere da noção mais difundida de bioeconomia, frequentemente centrada na substituição de insumos fósseis por biomassa em cadeias industriais. A bioeconomia das conexões amplia esse horizonte ao reconhecer que o potencial transformador está nas relações entre sistemas — na integração de ciclos ecológicos e produtivos, na cooperação entre cadeias de valor e na inteligência distribuída dos territórios. Seu avanço depende da convergência entre políticas públicas, ciência e investimento orientado para modelos que conciliem rentabilidade, regeneração ambiental e inclusão social.
Ao propor a ativação dessas conexões, o Brasil leva à COP30 uma visão que nasce da própria trajetória e experiência: a de um país que transformou ciência e diversidade em força produtiva e, agora, pode inspirar um novo ciclo de prosperidade tropical. Essa visão propõe que o desenvolvimento do século 21 se construa sobre a integração entre conhecimento, natureza e sociedade — uma economia viva, capaz de regenerar ecossistemas, reduzir desigualdades e gerar inovação a partir da biodiversidade.
A ciência agronômica alinha-se naturalmente a essa lógica, pois nasceu da necessidade de integrar conhecimentos e práticas para produzir de forma racional, evoluindo para reconhecer limites ecológicos e incorporar sustentabilidade como princípio orientador. Por essência, é uma ciência de conexões — entre solo, água, plantas, clima e pessoas — e de tradução da complexidade dos sistemas vivos em soluções aplicáveis aos territórios.
Essa evolução ampliou seu escopo: de uma ciência voltada principalmente à produtividade para outra que integra regeneração, conservação e inclusão social como dimensões inseparáveis do desenvolvimento. Foi essa trajetória que permitiu ao Brasil transformar vastas regiões tropicais com sistemas produtivos baseados em pesquisa, inovação e manejo inteligente — hoje mais preparados para enfrentar os desafios climáticos e sociais do nosso tempo.
Essa trajetória confere à ciência agronômica um papel central na bioeconomia das conexões. Ao combinar observação empírica, modelagem científica e diálogo com os territórios, a agronomia fornece a infraestrutura de conhecimento para articular produção e conservação em bases regenerativas. Sua capacidade de integrar tecnologias emergentes e práticas de manejo adaptadas aos biomas tropicais permite transformar desafios ambientais e sociais em oportunidades de inovação e progresso.
A ABCA, ao propor essa visão, lança um chamado à convergência. Governos, empresas, agricultores, cientistas e comunidades precisam alinhar esforços em torno de uma agenda para transformar conhecimento em soluções concretas nos territórios. Com sua base científica sólida e diversidade biológica sem paralelo, o Brasil tem condições únicas para propor ao mundo um novo pacto entre sociedade e natureza — um modelo de desenvolvimento ancorado na força da ciência, na riqueza dos seus biomas e na capacidade criativa de seu povo, capaz de gerar prosperidade com regeneração.
A COP30 pode marcar o momento em que o Brasil apresenta ao mundo um novo paradigma — não baseado na competição por recursos finitos, mas na integração entre biodiversidade, conhecimento e desenvolvimento humano. A bioeconomia das conexões propõe unir produção e conservação, ciência e sociedade, convertendo a inteligência dos trópicos em soluções para um mundo em transição.
