
Esta semana começa com uma espécie de "ressaca" das tribulações dos últimos dias. De um lado, o julgamento da Ação Penal 2668 — que trata da trama golpista — condenou, pela primeira vez na história, um ex-presidente. Em paralelo, o assassinato de Charlie Kirk escancarou a extrema polarização política que cresce nos Estados Unidos (e no mundo). Tudo isso enquanto o Nepal enfrentava protestos políticos sem precedentes e cheios de camadas. No meio desse furacão, acho importante chamar a atenção para os ventos que embalam essa tempestade: a espetacularização.
O conceito não é necessariamente novo ou conhecido. A data de surgimento é incerta, mas ele foi sistematizado no livro A sociedade do espetáculo, de Guy Debord, em 1967. Em linhas gerais, a espetacularização é o processo de transformar eventos em algo dramático e excessivo, com o objetivo de chocar, atrair atenção e manipular o comportamento público.
É claro que o assassinato de Kirk, o julgamento da trama golpista e a crise no Nepal já são relevantes por si só — não precisam de drama para ganhar as páginas dos jornais. Contudo, precisam, sim, de um "empurrãozinho" para se perpetuarem nas redes sociais.
Essas plataformas viraram um palco da espetacularização, uma espécie de catapulta, onde os fatos do cotidiano dobram de tamanho e passam a parecer ameaçadores. O funcionamento desse mecanismo nas redes sociais é simples: prender a atenção dos usuários por meio da velocidade, do sensacionalismo e do choque. Muitas vezes, isso contribui para a disseminação de desinformação, já que os algoritmos monetizam conteúdos que geram mais engajamento — e não aqueles que oferecem informação de qualidade.
O assassinato se ramifica em vídeos, declarações de políticos, ameaças, brigas. O julgamento ganha "edits", memes, guerras de comentários.
A engrenagem, por vezes cruel, não é novidade. Mas, nas redes sociais, a espetacularização se transforma em uma bomba. A começar pela desumanização dos envolvidos, que se tornam apenas "personagens" de uma narrativa. A desinformação também se multiplica. Imagens podem até dizer mais que mil palavras, mas nunca explicaram mais do que um parágrafo. Para compreender um acontecimento, são necessários dados, contexto e análise — elementos frequentemente preteridos pela lógica da espetacularização.
Nesse palco de drama, a empatia se transforma em algo banal. Afinal, logo outro drama nascerá. A indiferença vira regra. Vale lembrar que o engajamento gerado pela espetacularização também se traduz em lucro. E fica a pergunta: quem lucra com essa situação?
Cada espetacularização mergulha a discussão em um loop infinito de tragédias. Não se caminha em direção a soluções; ao contrário, desvia-se o foco delas. Ao enfatizar o drama e não as causas estruturais — falhas de segurança, políticas públicas, desigualdades sociais —, a espetacularização tira a atenção das medidas necessárias para evitar problemas e prefere deixá-los prosperar.
Pode até não parecer, mas os acontecimentos da semana passada não são o fim do mundo. Grande parte do que se vê nas redes sociais é apenas uma espetacularização. O segredo é saber perceber.