
Bruno Gomes — sociólogo (Sorbonne) e mestre em geopolítica (Universidade de Paris 8). Sócio fundador da HUMANA – Serviços em Sustentabilidade
A inserção recente, pelos Estados Unidos, dos minerais críticos e estratégicos como mais um elemento nas negociações comerciais com o Brasil é apenas a última manifestação de um interesse que não deve parar de crescer nos próximos anos. Mais países virão para garantir o abastecimento em recursos fundamentais para sua segurança energética em um contexto de transição, tanto para novas tecnologias de ponta quanto para a indústria de defesa, mais uma vez em ascensão na Europa.
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Nesse contexto, o Brasil precisa urgentemente de uma política específica para esses recursos. Uma política que proteja os interesses nacionais, que seja garantidora de direitos e que, principalmente, assegure que a exploração de todo e qualquer bem mineral tenha um sentido público, se desdobrando em benefícios concretos para a população. É sempre bom lembrar: o subsolo do Brasil, e tudo aquilo que lá se encontra, pertence à União, ou seja, é propriedade do povo brasileiro.
Para além do óbvio (pesquisa do potencial geológico, estudos sobre as necessidades de nossa própria transição energética, determinação da criticidade e caráter estratégico de cada bem mineral), uma política nacional de minerais críticos e estratégicos deve conter, igualmente, três aspectos fundamentais. Em primeiro lugar, o adensamento e a promoção de cadeias industriais associadas aos recursos explorados, criando valor agregado, empregos, arrecadação e oportunidades de negócios e investimento; em segundo lugar, uma estratégia bem construída com disposições concretas, inclusive de natureza financeira e tributária, quanto ao incentivo à economia circular, ao reúso, ao reaproveitamento e à reciclagem dos bens minerais já extraídos do solo e onipresentes em nossas cidades; e, por fim, um conjunto de medidas que busque garantir um desenvolvimento socioeconômico justo, enfrentador das desigualdades e contradições que permeiam o país. Todos considerando cada um dos territórios onde serão extraídos, transportados ou transformados tais recursos.
No ano da COP30, o Brasil tem, sim, a possibilidade de se mostrar um parceiro confiável, disposto a contribuir com a transição e a segurança energética do resto do mundo. Porém, como nação e como sociedade, e assim como se comportam os demais países, do mais ao menos amigável, devemos fazer as escolhas políticas necessárias para que cada grama de nossos recursos minerais (finitos, é bom lembrar) contribua para melhorar a vida dos brasileiros. Toda e qualquer facilidade acordada a projetos considerados estratégicos nesse setor, seja do ponto de vista tributário, aduaneiro e no acesso a crédito, seja com uma agilidade no processo de licenciamento (que pressupõe igual rigor, porém com multiplicação de esforços), deve, assim, estar atrelada a investimentos obrigatórios em pesquisa e inovação, por um lado, e em desenvolvimento socioeconômico dos territórios, por outro lado.
Grandes projetos e investimentos na exploração de minerais críticos e estratégicos, sem dúvida, participarão das transformações que irão ajudar o mundo a enfrentar a crise climática, descarbonizando a economia e nossos modos de vida, porém não podem fazê-los sacrificando o bem-estar social, ambiental e econômico das populações com as quais convivem, compartilhando de um mesmo território. Já existem exemplos de projetos robustos, com resultados concretos e mensuráveis, implementados em parceria por empresas e poder público, que evidenciam a oportunidade de se investir em ações de planejamento e governança territorial, diversificação e dinamismo econômico, construindo agendas territoriais compartilhadas, fortalecendo capacidades institucionais e imaginando novos mecanismos financeiros voltados ao desenvolvimento.
A política dos royalties da mineração (a CFEM, Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais), principalmente de matérias-primas críticas e estratégicas, deve ser reestruturada, reaberta a uma discussão democrática com toda a sociedade, para que tenha destinação clara e precisa, em benefício do interesse público. Assim como já acontece com o petróleo do pré-sal, por exemplo.
Na nova geopolítica mineral, o Brasil pode ser um bom fornecedor de recursos para o mundo, pode ser um grande ator — de primeiro plano - em cadeias industriais globalizadas e mais sustentáveis, mas deve ser, antes de mais nada, um formador de futuro para seu próprio povo.