INSS

Visão do Correio: transparência do INSS precisa ser restaurada

O INSS, ao longo dos anos, transformou-se em um labirinto burocrático vulnerável ao crime e inóspito para o cidadão honesto. Romper com esse padrão é tarefa urgente e civilizatória

A cada nova operação, o enredo se repete: corrupção entranhada, conluio entre servidores e fraudadores, prejuízo bilionário aos cofres públicos — e às vítimas, quase sempre os mais pobres e desprotegidos -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
A cada nova operação, o enredo se repete: corrupção entranhada, conluio entre servidores e fraudadores, prejuízo bilionário aos cofres públicos — e às vítimas, quase sempre os mais pobres e desprotegidos - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

O governo deu um passo importante ao deflagrar a Operação Sem Desconto, mirando um dos maiores esquemas de corrupção já instalados no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O desvio bilionário é mais um capítulo de uma velha história: a captura de estruturas públicas por quadrilhas especializadas em fraudar os mais vulneráveis — neste caso, aposentados e pensionistas.

Acerta o Executivo ao mobilizar a Controladoria Geral da União (CGU) para investigar os malfeitos e a Advocacia-Geral da União (AGU) para atuar na linha de frente do ressarcimento às vítimas. Agora, é um caso de polícia a cargo das investigações da Polícia Federal (PF). É o mínimo a se fazer diante do descaso institucional que permitiu o desconto sistemático de valores em nome de associações fantasmas e serviços jamais contratados durante tantos anos.

Mas o mérito da ação só será completo se os responsáveis — dentro e fora do Estado — forem exemplarmente punidos. A transparência deve ser restaurada. A eficiência, perseguida com seriedade. O INSS, ao longo dos anos, transformou-se em um labirinto burocrático vulnerável ao crime e inóspito para o cidadão honesto. Romper com esse padrão é tarefa urgente e civilizatória.

O caso revelado pela Operação Sem Desconto escancara essa corrupção endêmica. A CGU identificou um aumento significativo nos valores descontados dos benefícios do INSS por entidades associativas, passando de R$ 413 milhões em 2016 para R$ 2,8 bilhões em 2024. Era um esquema de descontos associativos não autorizados, feitos por entidades e sindicatos, totalizando cerca de R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.

A cada nova operação, o enredo se repete: corrupção entranhada, conluio entre servidores e fraudadores, prejuízo bilionário aos cofres públicos — e às vítimas, quase sempre os mais pobres e desprotegidos. Em setembro de 2024, a PF havia desarticulado uma organização criminosa que obtinha ilegalmente dados de beneficiários do INSS para comercialização. O grupo era composto por hackers que invadiam os sistemas do INSS, servidores que vendiam suas credenciais de acesso e intermediários que comercializavam as informações obtidas.

Na década de 1990, a advogada Jorgina de Freitas Fernandes e uma quadrilha composta por juízes, advogados e servidores públicos fraudavam processos judiciais para desviar recursos do INSS, resultando em um prejuízo estimado em aproximadamente R$ 2 bilhões. Jorgina foi condenada a 14 anos de prisão. 

A Operação Miquéias, em 2013, investigou duas organizações criminosas — uma especializada em lavagem de dinheiro e outra em má gestão de recursos de entidades previdenciárias públicas — e  revelou que prefeitos e gestores de regimes próprios de Previdência Social eram aliciados para aplicar recursos em fundos de investimentos geridos pela quadrilha, resultando em prejuízos significativos.

Em 2015 e 2016, a Operação Nenhures, também da PF, desmantelou uma quadrilha que falsificava certidões de nascimento para obter ilegalmente pensões por morte do INSS. A investigação, realizada em Minas Gerais e na Bahia, estimou um prejuízo de aproximadamente R$ 6,5 milhões aos cofres públicos. Diversas pessoas foram presas, incluindo servidores públicos e intermediários.

A corrupção endêmica é mais do que um problema administrativo — é um desafio civilizatório. Que a operação deflagrada nesta semana marque o início de uma faxina moral e funcional em um dos órgãos mais estratégicos para a dignidade da população brasileira.

 


Por Opinião
postado em 26/04/2025 06:01
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