Internacional

Não a todo o extremo

É inconcebível que democracias consolidadas flertem com o radicalismo e com o ultraconservadorismo. Apoiar a extrema-direita é ignorar avanços sociais, retroceder no tempo, ser cúmplice das mortes dos menos favorecidos

Uma pessoa carimba um cartão eleitoral numa assembleia de voto no dia da votação para a primeira volta das eleições parlamentares em Sainte Rose, no arquipélago ultramarino francês de Guadalupe, em 29 de junho de 2024. -  (crédito: Carla Bernhardt/AFP)
Uma pessoa carimba um cartão eleitoral numa assembleia de voto no dia da votação para a primeira volta das eleições parlamentares em Sainte Rose, no arquipélago ultramarino francês de Guadalupe, em 29 de junho de 2024. - (crédito: Carla Bernhardt/AFP)

Não é questão de ser de esquerda, de centro ou de direita. É questão de ser humano ou não. De ter valores arraigados na distribuição mais justa de renda ou de favorecer apenas uma camada da população, enquanto outra termina condenada quase que ao esquecimento. O espectro político-ideológico fala muito sobre o caráter e a índole de uma pessoa. Misoginia, racismo, homofobia, políticas anti-imigração, islamofobia... A extrema-direita é guiada pelo preconceito e pela falsa noção de que minorias precisam ser esmagadas. O "extremo" da extrema-direita, o regime nazista de Adolf Hitler, perseguiu; discriminou; disseminou a miséria; segregou aqueles que não se encaixavam à pretensa raça ariana e os confinou em guetos; exterminou milhões de judeus. É inconcebível que, oito décadas depois do Holocausto, partidos políticos se inspirem nas ideias de Hitler e grupos de nacionalistas cultuem o neonazismo como regra de vida. 

No próximo domingo, a França — erigida pela tríade "liberdade, igualdade e fraternidade" — correrá o grande risco de conceder ao ultraconservador Reagrupamento Nacional, de Marine Le Pen, a vitória no segundo turno das eleições legislativas e a consequente concentração de poder na Assembleia Nacional, caso o partido obtenha maioria absoluta. Seria o primeiro partido de extrema-direita a chegar ao comando da França em oito décadas. Um convite à perseguição aos imigrantes, aos muçulmanos e às minorias étnicas. A destruição de tudo o que é mais valioso na democracia e na política do bem-estar social.  

A leste, o partido Alternativa para a Alemanha (AfD) saiu fortalecido  depois das eleições do Parlamento Europeu. Seus políticos chegaram a participar de reuniões secretas com neonazistas, nas quais debateram a deportação em massa de imigrantes, mas também de cidadãos alemães.  A AfD é acusada de tentar redefinir a composição étnica da Alemanha, nos moldes do que Hitler fez com a chamada raça ariana. Sua ideologia compreende tudo o que há de mais execrável e absurdo. Nos Estados Unidos, as incertezas a respeito da lucidez de Joe Biden e o péssimo desempenho do democrata no debate da semana passada escancaram as portas da Casa Branca para o retorno de Donald Trump. A volta do magnata republicano machista, misógino, racista, chauvinista e egocêntrico seria uma faca no pescoço do Tio Sam e de tudo o que representa: a chamada terra das liberdades. 

Tudo o que é extremo também é nocivo. É inconcebível que democracias consolidadas flertem com o radicalismo e com o ultraconservadorismo. Apoiar a extrema-direita é ignorar avanços sociais, retroceder no tempo, ser cúmplice das mortes dos menos favorecidos. No Brasil, ela conta com o reforço de igrejas neopentecostais que pretendem impor à nação seus credos ou que fazem questão de trocar a Constituição pela Bíblia, ignorando o caráter laico do Estado e forjando uma teocracia. Também com a figura construída em fake news de um quase líder messiânico, o qual acreditavam que conduziria o país à salvação. Em qualquer lugar, a extrema-direita tem, em comum, o apreço pelas fake news e uma cartilha de linguagem do ódio. 

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postado em 03/07/2024 06:00
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