
Keiji Minatoya pensou que sua hora havia chegado quando um urso o derrubou no chão e mordeu seu rosto na garagem de casa, no norte do Japão. Ele sobreviveu ao ataque, que aconteceu em 2023 na província de Akita. Nos últimos meses, a região tem assistido a um crescimento exponencial de encontros mortais com esses animais.
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Desde abril, um número recorde de 13 pessoas morreram por causa dos ursos, e dezenas de japoneses, aterrorizados, relatam como os animais têm invadido casas, rondado escolas e até entrado em supermercados.
Além disso, cerca de 100 pessoas ficaram feridas entre abril e setembro, segundo dados oficiais.
O assunto virou séria preocupação para o governo, que agora tenta enfrentar o problema inclusive com a mobilização de soldados.
Os cientistas atribuem o fenômeno ao grande crescimento da população de ursos e à escassez de alimentos este ano, especialmente de bolotas (fruto do carvalho).
O balanço desde abril já é duas vezes superior ao recorde anterior, registrado há dois anos.
Os ataques de ursos pardos — que podem pesar 500 kg e correr mais rápido que um homem — e de ursos negros asiáticos afetam principalmente o norte do país.
Entre as vítimas recentes está um homem de 67 anos que foi encontrado decapitado em outubro na província de Iwate, vizinha de Akita.
54 mil ursos
O número de ursos pardos dobrou em 30 anos, atingindo 12 mil animais, enquanto a população de ursos negros chega a 42 mil em Honshu, a principal ilha do Japão, segundo o governo. "O tamanho da população excede a capacidade das montanhas", explica Naoki Ohnishi, pesquisador do Instituto de Pesquisa Florestal.
Embora o aumento das temperaturas devido às mudanças climáticas chegue a provocar um excesso de bolotas em alguns períodos, a produção varia muito de um ano para outro. Em 2025, ela foi relativamente baixa, assim como em 2023, quando Minatoya foi atacado.
O resultado é que os ursos, muitas vezes acompanhados de seus filhotes, descem para a cidade em busca de comida, explica Shinsuke Koike, professor da Universidade de Agricultura e Tecnologia de Tóquio.
O medo é palpável nos pequenas localidades, onde os habitantes penduram sinos nas suas bolsas para afugentar os ursos e comentam os ataques nos bares. Por toda parte há cartazes alertando sobre o perigo.
"Quase todos os dias se ouve falar de ataques", alerta Kakeru Matsuhashi, um "matagi", ou caçador tradicional do nordeste do Japão, de 28 anos.
Para o pesquisador Ohnishi, o "abate em massa" de ursos é a única solução eficaz para garantir a segurança dos habitantes. Mas faltam recursos: o número de caçadores caiu pela metade desde 1980, chegando a 220 mil em 2020.
Mesmo assim, em 2023 e 2024, mais de 9 mil ursos foram abatidos. Outros 4,2 mil foram mortos entre abril e setembro do ano passado.
Em Akita, onde já foram sacrificados mais de mil animais este ano, as autoridades solicitaram a ajuda do Exército para transportar armadilhas, caçadores e animais capturados.
Além disso, os policiais de choque agora podem atirar nos animais, após uma flexibilização das regras sobre o uso de suas armas.
O inverno trará um alívio: os ursos hibernarão, o que reduzirá as incursões, mas a ameaça persiste.
"É como viver em um safári de ursos", diz Hajime Nakae, professor de Medicina no hospital universitário de Akita, que há 30 anos trata ferimentos causados por esses animais. "Estamos testemunhando uma catástrofe."

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