
Por Jorge Ulisses Jacoby Fernandes* e Gustavo Valadares** — A utilização indevida do regime de precatórios para pagamentos contratuais com previsão orçamentária compromete gravemente a credibilidade da Administração Pública e gera profunda insegurança no mercado.
Fornecedores e prestadores de serviços, diante da incerteza quanto ao recebimento de valores devidos, tendem a majorar preços para compensar o risco, onerando o erário e prejudicando a eficiência das contratações públicas.
Estudos econômicos demonstram que a insegurança jurídica pode elevar em até 30% o custo das contratações públicas, conforme apontado por Marcos Nóbrega em sua obra "Contratos Públicos e Segurança Jurídica".
A Administração deve reproduzir a boa-fé em todos os seus atos, sendo a previsibilidade e o cumprimento tempestivo das obrigações contratuais elementos essenciais para a manutenção de um ambiente negocial saudável.
A imprevisibilidade quanto ao recebimento de valores contratualmente devidos afasta potenciais fornecedores idôneos e favorece a participação de empresas que superfaturam para compensar o risco de inadimplência estatal".
Floriano de Azevedo Marques Neto e Rafael Véras fazem relevante alerta, ao apontar que a deterioração da confiança nas contratações públicas gera um ciclo vicioso, considerando que menos empresas participam das licitações, reduz-se a competitividade, elevam-se os preços e compromete-se a qualidade dos bens e serviços adquiridos, devendo considerar os curtos de transação das contratações realizadas pelo Poder Público.
O impacto dessa prática estende-se além das relações contratuais individuais, afetando o próprio desenvolvimento econômico regional.
Pequenas e médias empresas, que dependem do fluxo de caixa regular, são particularmente prejudicadas, podendo ser levadas à insolvência pela demora nos pagamentos.
A confiança legítima do contratado que cumpriu regularmente suas obrigações impede que a Administração invoque institutos jurídicos de forma desvirtuada para frustrar o pagamento devido. Inclusive, o princípio da segurança jurídica veda que a Administração surpreenda o contratado com interpretações criativas que frustrem expectativas legítimas de recebimento.
Importante destacar que a Administração deve responder pelos danos causados a empresas que, em razão do atraso injustificado nos pagamentos, sofreram prejuízos financeiros ou foram impedidas de honrar seus próprios compromissos.
Sabe-se que o art. 100 da Constituição Federal preceitua que os pagamentos devidos pela Fazenda, em virtude de sentença, se submetem ao regime de precatórios, e devem observar a ordem cronológica de credores. O regime de precatórios assegura a igualdade entre credores e impede favorecimentos indevidos, exigindo a observância da ordem cronológica de apresentação dos precatórios.
Dessa forma, impõe-se reconhecer que a submissão de obrigações decorrentes de contratos administrativos regularmente firmados, nos quais há prévia dotação orçamentária, emissão de empenho e liquidação da despesa, ao regime de precatórios representa manifesta distorção do modelo constitucional.
A distinção entre empenho e execução judicial é precisamente o cerne da questão. Quando há empenho, existe disponibilidade orçamentária; logo, inexiste o pressuposto fático do precatório: a ausência de recursos.
A tentativa de sujeitar essas obrigações à sistemática do art. 100 da Constituição Federal, cuja lógica se aplica a dívidas judiciais típicas, transforma obrigações voluntárias, planejadas e orçamentariamente previstas em passivos judiciais incertos, em detrimento da previsibilidade, eficiência e economicidade das contratações públicas.
Tal prática, além de afrontar os princípios da legalidade, da boa-fé e da segurança jurídica, frustra legítimas expectativas dos contratados e compromete a credibilidade da própria Administração Pública enquanto parte contratual.
Trata-se de desvio que, além de ampliar os custos de transação, penaliza o bom fornecedor, desequilibra a relação contratual e vulnera o ambiente de negócios, contrariando os fundamentos constitucionais da ordem econômica e da moralidade administrativa.
Advogado, mestre em direito público, professor de direito administrativo, escritor, consultor, conferencista e palestrante*
Especialista em direito do comércio internacional e pós-graduado em direito do Estado, possui experiência nas áreas de processo civil, crimes contra a administração pública e improbidade administrativa**
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