
Por Gilmar Lopes de Abreu* — A democracia brasileira se constrói sobre princípios fundamentais, como a igualdade de chances entre os competidores eleitorais e a moralidade administrativa (art. 14 e art. 37 da Constituição Federal). Dentro desse cenário, a propaganda partidária e a propaganda eleitoral cumprem papéis distintos e bem definidos pelo ordenamento jurídico.
De um lado, a Lei nº 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos), em seu artigo 50-B, estabelece que a propaganda partidária destina-se a difundir os ideais do partido, estimular a participação política da sociedade e fortalecer a democracia. Importante ressaltar que o §4º desse mesmo artigo veda expressamente o uso dessa propaganda para promoção pessoal de candidatos ou para tratar de temas que não guardem relação direta com a atividade partidária.
De outro lado, a Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições) disciplina, em seu artigo 36, que a propaganda eleitoral somente é permitida a partir de 15 de agosto do ano eleitoral. Antes dessa data, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem entendido que não se configura propaganda eleitoral antecipada na ausência de pedido explícito de voto.
É justamente nesse ponto que se instala uma zona de tensão normativa: entre a vedação da promoção pessoal na propaganda partidária e a exigência de pedido explícito de voto para caracterizar a propaganda eleitoral antecipada. Essa "penumbra jurídica" pode abrir espaço para práticas que, embora formalmente não infrinjam a Lei das Eleições, desvirtuam a finalidade da propaganda partidária.
Em outras palavras, ao se utilizar espaço público e recursos custeados pelo erário para exaltar realizações administrativas ou enaltecer a figura de mandatários, corre-se o risco de transformar a propaganda partidária em instrumento indireto de autopromoção eleitoral, contrariando os princípios constitucionais da moralidade, impessoalidade e igualdade de oportunidades no pleito.
Esse desvio de finalidade não deve ser visto como mero tecnicismo jurídico. Ele pode comprometer a lisura do processo eleitoral, desequilibrar a disputa e enfraquecer a confiança social nas instituições democráticas.
Em uma democracia que se pretende sólida, é essencial que a propaganda partidária permaneça fiel ao seu objetivo: divulgar ideias, valores e programas partidários, e não servir de vitrine pessoal para agentes políticos já investidos em cargos eletivos.
A Constituição assegura, no art. 17, que os partidos políticos são instrumentos de expressão democrática. Para que esse papel não seja esvaziado, é indispensável que se preservem os limites legais de cada modalidade de propaganda.
É necessário debater, refletir e agir para que a propaganda partidária não se converta em gasto público destinado a enaltecer individualidades, mas se mantenha como ferramenta legítima de fortalecimento da cidadania.
Respeitar os limites traçados pela Lei dos Partidos Políticos e pela Lei das Eleições não é apenas uma questão jurídica, mas sobretudo um imperativo democrático. Ao se evitar a confusão entre propaganda partidária e propaganda eleitoral, garante-se não apenas a legalidade, mas também a ética e a legitimidade do processo político brasileiro.
Para melhor equilíbrio na concorrência de cargos públicos eletivos entre os brasileiros é de suma importância ter uma Proposta Legislativa para alterar a Lei nº 9.096/1995 e vedar expressamente a participação de detentores de mandato político em propagandas partidárias ou que tenham interesse em participar do próximo ano letivo.
Advogado e integrante da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/DF*
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