
Por Luís Eduardo R. Moraes Oliveira* — Sabe-se que cabe reclamação para preservar a competência do tribunal, garantir a autoridade de suas decisões, a observância de enunciado de súmula vinculante, de decisão do STF em controle concentrado de constitucionalidade, ou ainda de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR) ou de incidente de assunção de competência (IAC).
Por outro lado, a arbitragem é um sistema alternativo de resolução de conflitos, no qual pessoas capazes de contratar podem dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
Os árbitros e as partes estão vinculados à convenção de arbitragem, que é seu documento fundamental. Mas estariam vinculados também aos precedentes judiciais? Há quem defenda a estrita observância, pelos árbitros, aos precedentes judiciais, sobretudo os vinculantes, previstos no rol do artigo 927 do CPC.
Contudo, há que se reconhecer certa margem de liberdade à jurisdição arbitral. Ora, as partes optam por não levar seu conflito ao Estado-juiz, escolhendo um sistema mais célere, sem previsão de recursos — salvo pedido de esclarecimentos ao próprio árbitro — e com revisão judicial restrita aos casos taxativos de nulidade da sentença arbitral.
É certo que a arbitragem não pode se descolar da realidade jurídica na qual se insere, o que inclui o conhecimento das decisões proferidas pelos juízes togados sobre determinada matéria. No entanto, entende-se que o árbitro deve observar, estritamente, a convenção de arbitragem e, se a arbitragem for de direito, o sistema jurídico escolhido. Jamais, porém, estaria obrigado a seguir os precedentes judiciais, pois isso equivaleria a submeter um sistema privado de justiça à obediência incondicional ao Poder Judiciário.
O árbitro é livre para decidir conforme seu melhor entendimento, inclusive por equidade, se autorizado. É, afinal, juiz de fato e de direito, e sua sentença não está sujeita a recurso nem à homologação judicial.
Dessa forma, os árbitros não devem observância estrita às decisões oriundas da jurisdição estatal, sendo suas decisões passíveis de controle apenas nas hipóteses de nulidade, previstas taxativamente no artigo 32 da Lei de Arbitragem. Nesses casos, o controle se dá por meio de ação de nulidade, e não por reclamação ou mandado de segurança.
Por outro lado, considerando que parte da doutrina sustenta que o árbitro deve seguir incondicionalmente os precedentes judiciais, especialmente os vinculantes, admite-se, nesse caso, a possibilidade da reclamação.
Nesse cenário, surgem algumas questões: qual seria o procedimento adequado? A reclamação seria processada pelo próprio árbitro ou pelo tribunal arbitral? Caso o árbitro ignorasse uma decisão do STF, seria o Supremo o competente para julgar a reclamação? E se fosse uma decisão do STJ? É importante lembrar que tais tribunais sempre demonstraram resistência em admitir o uso irrestrito da reclamação como meio de controle de suas decisões.
Além disso, o CPC exige o esgotamento das instâncias ordinárias antes da reclamação. Seria necessário, então, apresentar pedido de esclarecimentos ao árbitro e ajuizar ação de nulidade, para só depois propor a reclamação?
A jurisdição arbitral é passível de controle apenas nos casos expressos de nulidade da sentença arbitral, sendo que a inobservância de precedentes judiciais não integra o rol do artigo 32 da Lei de Arbitragem.
Ao árbitro deve ser garantida liberdade decisória. As partes, ao optarem pela arbitragem, afastam voluntariamente a jurisdição estatal e definem, na convenção, o procedimento a ser seguido, o que torna inviável a utilização da reclamação como instrumento de controle de mérito da decisão arbitral, preservando-se, assim, a segurança jurídica do instituto.
Caso se entenda de forma diversa, e se considere que a não observância de precedentes vinculantes autoriza o uso da reclamação, surge uma nova inquietação: quem exercerá esse controle, já que não cabe recurso da sentença arbitral? Seria essa função do STF ou do STJ?
É difícil imaginar que os tribunais superiores estejam dispostos a abrir essa porta, correndo o risco de sobrecarregar ainda mais suas competências. Mas o tema, sem dúvida, merece reflexão.
Advogado, autor de livros e artigos jurídicos*
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