
A COP30 está começando em Belém, capital do Pará, sob novo alerta: 2025 caminha para ser um dos anos mais quentes já registrados na história, e o limite de aumento da temperatura global previsto no Acordo de Paris voltou a ser ultrapassado em outubro. Relatórios recentes da Organização Meteorológica Mundial (OMM) e do Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus (C3S), da União Europeia, confirmam a aceleração do aquecimento global e o aumento contínuo das concentrações de gases de efeito estufa, em níveis sem precedentes.
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Segundo a OMM, o período entre 2015 e 2025 será o mais quente desde o início dos registros, há 176 anos. Embora 2025 não deva ultrapassar os recordes de 2024, deve ocupar o segundo ou terceiro lugar no ranking histórico. Dados do C3S indicam que a temperatura média global do ar na superfície em outubro de 2025 ficou 1,55°C acima da média pré-industrial, o primeiro mês a superar o limite de 1,5°C desde abril.
Conforme o relatório, a média anual, considerando novembro de 2024 a outubro de 2025, foi 1,5°C acima do nível pré-industrial. Para os especialistas, esse resultado reforça o alerta de que o planeta já vive acima da meta estabelecida pelo Acordo de Paris.
Diretora da OMM, Celeste Saulo reconhece a gravidade da situação, mas destaca que ainda há chances para reverter parte dos impactos. "Essa sequência sem precedentes de altas temperaturas, combinada ao aumento recorde dos níveis de gases de efeito estufa, mostra que será praticamente impossível evitar o estouro temporário do limite de 1,5°C. Ainda assim, é totalmente possível e essencial reduzir as temperaturas até o fim do século."
O secretário-geral da ONU, António Guterres, reforçou o apelo à ação durante a divulgação do relatório. "Cada ano acima de 1,5°C afetará economias, agravará desigualdades e causará danos irreversíveis. Devemos agir agora, com rapidez e em larga escala, para que o excesso seja breve e seguro, e para que as temperaturas voltem a cair antes do fim do século."
Ronaldo Christofoletti, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), frisou que o fato de 2025 não bater recorde de temperatura não significa que o planeta esfriou. "Continuar entre os três anos mais quentes da história mostra que estamos vivendo uma fase na qual o aquecimento atingiu outro patamar."
Segundo ele, é como ligar um fogão ou um ar-condicionado. "A temperatura não fica constante, uma hora esquenta um pouco, outra hora esfria, vai ajustando. É isso que acontece entre os anos, um ano é um pouco mais quente, outro mais frio, mas todos os anos nessa avaliação continuam muito mais quentes do que costumavam ser no passado."
Oceanos mais quentes
Os boletins do C3S e da OMM revelaram ainda que o aquecimento global está provocando mudanças rápidas nos oceanos e nas calotas polares. A temperatura média da superfície do mar atingiu 20,54°C em outubro de 2025, o terceiro valor mais alto já registrado. O Ártico apresentou 12% menos gelo do que a média, enquanto a Antártida teve a terceira menor extensão marinha congelada.
Segundo as publicações, essas anomalias estão diretamente associadas a fenômenos meteorológicos extremos que marcaram o ano, como inundações, ondas de calor, incêndios florestais e secas severas em diferentes regiões do planeta. "As repercussões nas vidas, nos meios de subsistência e nos sistemas alimentares são cada vez mais evidentes", afirmou a OMM.
Em contraste, a organização destacou "avanços importantes" na expansão de sistemas de alerta precoce multirrisco, que hoje estão presentes em 119 países — mais que o dobro de 2015. Contudo, cerca de 40% das nações ainda não contam com esses mecanismos, especialmente as mais vulneráveis às mudanças climáticas.
A líder climática do C3S, Samantha Burgess, resumiu o momento que antecede a COP30. "Estamos na década em que o limite de 1,5°C será provavelmente ultrapassado. O ritmo das mudanças climáticas está se acelerando e a necessidade de ação nunca foi tão urgente."
Marco Moraes, divulgador científico e autor do livro Planeta Hostil, destacou que 2023 e 2024 trouxeram exemplos claros dos impactos desse novo cenário de emergência climática. "Vimos isso com eventos extremos como ondas de calor, secas prolongadas, incêndios florestais, tempestades intensas e inundações, tanto no Brasil quanto em outras partes do mundo. Esses fenômenos tendem a se tornar mais frequentes e intensos à medida que as temperaturas médias globais continuam a subir."
Em outro relatório publicado na terça-feira, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) destacou, por sua vez, que as emissões de gases de efeito estufa aumentaram 2,3% no ano passado. Esse acréscimo foi impulsionado por Índia, China, Rússia e Indonésia.
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Nátali Piccolo, diretora de Conservação Marinha e Costeira da CI-Brasil
O relatório também demonstrou que tanto a Antártica quanto o Ártico reduziram a sua área de gelo e, além disso, temos o aumento da frequência, intensidade e localização das ondas de calor. Elas provocam um aquecimento muito abrupto e causam a morte da biodiversidade, o branqueamento de corais e de muitas espécies, que não conseguem se adaptar a esse incremento de temperatura tão rápido. O oceano é o ecossistema que mais balanceia o clima global, porque ele absorve 25% do carbono gerado e 90% do calor excedente.
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Karina Bruno Lima, doutora em climatologia e divulgadora científica
Outubro de 2025 terminou como o terceiro mais quente do registro instrumental, o que é uma notícia ruim, mas não surpreendente. Já sabemos que não conseguiremos alcançar a meta mais ambiciosa do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5°C. Agora a esperança recai sobre um cenário em que conseguimos nos manter abaixo de 2°C, com a menor média possível, pois esse pico que atingiremos é muito importante para determinar os impactos que teremos. Também temos que colocar as esperanças em um cenário de ultrapassagem, já que não alcançamos a meta dentro do prazo e não conseguimos um contexto que teria sido mais ideal.
Crescimento econômico impulsiona efeito estufa
O novo relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) revelou que o crescimento econômico é o principal fator responsável pelo aumento das emissões mundiais de gases do efeito estufa. Conforme a publicação, feita ontem, o desenvolvimento dos países emergentes, em particular, é um dos agravantes.
"O crescimento econômico é o motor das emissões nos países parceiros da OCDE", afirmou a organização internacional, formada por 38 Estados-membros, no Observatório da Ação Climática de 2025.
Entre os 'países parceiros' estão grandes economias emergentes, como China, Índia e Arábia Saudita, onde a liberação de gases não para de crescer, o que arrasta as emissões do restante do mundo. No entanto, há nações onde esse tipo de poluição diminui levemente, como Brasil, Indonésia e África do Sul.
Segundo os autores do relatório, a redução das emissões é a chave para combater o aquecimento global. Cada décimo de grau adicional acarreta uma série de perturbações para a biodiversidade, o ciclo da água e os desastres naturais. Nos países parceiros, "o crescimento da população e o forte crescimento econômico pesam mais que os avanços na eficiência energética", explicou a OCDE.
Os economistas da organização calcularam que nos países onde as emissões aumentaram entre 2015 e 2023, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foi o responsável por um acréscimo de 29,5% na liberação de gases do efeito estufa. A OCDE apontou ainda para "um ressurgimento da energia térmica a partir do carvão", apesar da "presença recorde de energias renováveis".
Já os países da OCDE, com economias industrializadas há mais tempo (e onde o crescimento foi feito à base de muita poluição, é preciso ressaltar), reduziram as emissões, melhorando a eficiência energética e recorrendo a fontes mais limpas, ao mesmo tempo que continuavam seu crescimento econômico e demográfico. Segundo o relatório, entre 2015 e 2023, a liberação de gases do efeito estufa nas nações mais desenvolvidas diminuiu 11,3%.
Segundo Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora-executiva do Instituto Internacional Arayara, o relatório da OCDE confirma uma realidade que o Instituto denuncia há anos. "O crescimento econômico baseado na queima de combustíveis fósseis está nos levando a um colapso climático. Países emergentes, como o Brasil, a Índia e a China, não podem repetir o modelo de desenvolvimento poluente das economias industrializadas. É urgente romper a falsa dicotomia entre crescimento e sustentabilidade."
A especialista detalhou que, no caso brasileiro, ainda que as emissões tenham recuado ligeiramente, as emissões do setor de energia cresceram, uma vez que o país insiste em expandir a fronteira fóssil — da Amazônia Equatorial ao Rio Grande do Sul — por meio de novas licitações de petróleo e gás. "Essa contradição mina a credibilidade do Brasil como anfitrião da COP30 e como líder potencial da transição energética global." (IA)

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