
O relatório do MapBiomas divulgado em maio trouxe dados esperançosos para a população, mas contestados por especialistas. Segundo o Relatório Anual de desmatamento no Brasil (RAD) 2024, a supressão de vegetação nativa diminuiu em todos os biomas do país: Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal. No entanto, o sucesso na preservação de um desses cenários, o Pampa, que apresentou redução de 42% no desmatamento em relação a 2023, é questionado por ambientalistas e entidades. A razão é simples: o sistema do MapBiomas detecta supressão em áreas de floresta, mas o Pampa é predominantemente formado por campos.
No documento, o MapBiomas indica que os dados do bioma, localizado no estado do Rio Grande do Sul, devem ser vistos com cautela. “As reduções observadas em biomas com ecossistemas campestres, principalmente o Pampa (redução de 42%), são atribuídas às áreas de florestas, pois sistemas de detecção de supressão de campos nativos ainda precisam ser aprimorados e integrados ao MapBiomas Alerta”, destaca. Procurado pelo Correio, o governo do Rio Grande do Sul afirma que “apenas repercutiu um dado divulgado no relatório do MapBiomas”.” Tendo em vista o conjunto de ações que vem sendo realizadas pelo governo gaúcho, que culminou na assinatura do Decreto do Pampa, a Sema entende que os dados positivos são reflexo das políticas públicas implementadas”, diz a nota.
A queda do desmatamento foi comemorada nos canais oficiais do governo do estado do RS, mas sem pontuar esse aspecto importante. Na publicação, o executivo estadual afirma ainda que “o bioma tem a menor área de desmatamento do relatório: 0,1% do total, ou 896 hectares”, mas sem destacar que esses dados se referem apenas às áreas de floresta.
Nas redes sociais, a Coalizão pelo Pampa, aponta que o governo do RS ignora a perda de vegetação campestre para “comemorar a ilusão do Pampa conservado”. “Ao contrário do que foi alardeado na imprensa e demais mídias, os números divulgados pelo MapBiomas estão longe de atestar o sucesso das políticas públicas do Governo gaúcho, ou de demonstrar valorização de boas práticas ou de diálogo democrático e relação transparente com diferentes setores da sociedade”, diz a nota.
Alerta
Apenas 12% do Pampa é composto por áreas florestais, segundo o MapBiomas. O bioma tem ainda 32% de vegetação campestre e 45% da área utilizada pela agropecuária. Ainda de acordo com a plataforma de monitoramento, de 2012 a 2023, o Pampa perdeu cerca de 140 mil hectares de vegetação campestre por ano.
Professor do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS), Valerio Pillar aponta que a divulgação dos dados sem enfatizar que se trata da análise de cobertura florestal gera desinformação. “O desmatamento de florestas no Pampa não é um problema, nunca foi”, aponta.
Segundo o pesquisador, as áreas de floresta do bioma não tem interesse agrícola, ao contrário das zonas campestres. Ele aponta que as principais ameaças dessas zonas são as monoculturas como a soja e a silvicultura — processo de reflorestamento para extração de madeira — sobretudo de eucalipto.
“Não são florestas”, pontua em relação às coberturas de eucalipto. “Quando as árvores crescem, as plantas campestres não sobrevivem”.
Para o especialista, ainda há fragilidades na legislação ambiental do bioma. “As pessoas pensam que não é floresta, então é mais fácil”, comenta. Segundo ele, apenas da vegetação rasteira, há derrubada das espécies para as atividades de monocultura.
Embora o bioma seja o menor do Brasil, estando restrito ao território do RS, o perigo está em como a flexibilização das normas ambientais pode se estender. “A legislação do Pampa está servindo como base para outras áreas de campo”, ressalta. Em menor escala, a vegetação campestre está presente em todos os biomas do país, incluindo grande parte do Pantanal e pequena porção da Amazônia.